domingo, 17 de novembro de 2024

Limpando meu armário, Eminem

 O bode expiatório é aquele que leva a culpa de tudo dentro de uma dinâmica familiar narcisista. Entre os irmãos, ele acaba sendo o culpado por tudo, e cresce talvez se revoltando, não sabendo como administrar isso. Muitas vezes, ele é o bode expiatório porque não tem outro filho. Então, pode haver uma dinâmica de ser o "bode expiatório" pela vida toda, mas não precisa ser assim. Não é porque você é o bode expiatório na família que vai ser assim para sempre.

Quando a gente se descobre como pessoa, como ser humano, e não apenas como um subproduto de uma mãe narcisista, percebemos que somos muito mais do que isso. Embora possamos ser vistos como vítimas, somos seres extraordinários. Porque, dentro dessas "nós", somos os mais fortes, pois levamos pancadas de todos os lados: dos irmãos, da mãe, do pai. Crescemos com uma resistência enorme e gigante, e temos um futuro brilhante pela frente. Aprendemos a ser fortes. 

O bode expiatório é a "ovelha negra" da família, e durante a infância, nós, os bodes expiatórios, ficamos medrosos, com muitos medos. No entanto, a fúria normalmente aparece na adolescência. Crescemos tentando encontrar nosso lugar, buscando uma turma onde nos encaixássemos. 

Essa falta de identidade é tão profunda que acabamos nos sentindo mais confortáveis sendo diferentes da sociedade, por nos vermos como seres diferentes. E isso se manifesta no jeito de se vestir, nas cores de cabelo e até mesmo na saúde. Lembro de quando eu tinha o cabelo colorido e percebia que muitas pessoas, especialmente meninas, passavam por isso também. Essa mudança de cabelo é uma forma de chamar atenção? Acho que não. Acho que é uma tentativa de se encontrar, de descobrir quem somos.

Eu acredito que essa falta de identidade é tão intensa que, às vezes, nos sentimos mais confortáveis sendo "diferentes". Eu, por exemplo, me encontrei com o rock porque sentia que ali era meu lugar. Andava de preto, e escondia isso da minha mãe. Mas, de repente, estava em outra tribo, buscando um lugar onde me sentisse aceita. Recentemente, publiquei uma foto minha com cabelo vermelho, e algumas meninas comentaram dizendo que também passaram por essa fase de mudar de cabelo, de estilo. Isso é uma forma de se encontrar.

Quero compartilhar com vocês a música de um bode expiatório muito conhecido, o cantor de rap americano Eminem. A música é "Clean My Closet" (ou "Limpeza do Meu Armário"). Essa música me ajudou a lidar com os sentimentos e a raiva que eu não tinha a oportunidade de expressar. Cantava alto, sozinha em casa, para liberar toda aquela raiva contida. Essa música foi uma maneira de expressar sentimentos que não podiam ser ditos em palavras.


"Onde está a batida?

Não tem nenhuma batida no meu fone

Lá vai você, é, aí aí

Já te odiaram ou te discriminaram?

Comigo já. Já me contestaram e protestaram contra mim

Placas de piquete pras minhas rimas perversas, olhe no "Times"

Doentias como os pensamentos da porra do moleque atrás


Toda a comoção, emoções profundas como oceanos explodindo

O mau humor dos pais crescendo, manda pro inferno e vá em frente

Não quero nada de ninguém, quero que sofram enquanto eu respirar

Continuo com tudo pela manhã e levando apelidos de noite

Estão indo embora com um sabor azedo como vinagre na boca

Eles podem armar pra cima de mim, mas nunca vão me entender

Olha só pra mim, você já deve estar cansada de mim

Não tá, mãe? Agora eu vou fazer você parecer uma ridícula

Desculpa, mãe, eu nunca quis te magoar

Eu nunca quis te fazer chorar

Mas hoje à noite, vou desabafar


Eu tenho uns fantasmas no passado, não sei se alguém sabe

Então antes de me jogarem no caixão e me fecharem lá

Vou mostrar tudo, vou te levar de volta pra 1973

Antes de eu ter um disco de platina

Eu era bebê, tinha só uns meses de idade

O V** do meu pai devia estar todo irritadinho com alguma coisa

Pois se mandou, me pergunto se ao menos me deu beijo de adeus

Na verdade não ,pensando melhor só quero que esse merda morra


Eu olho para a Hailie e não consigo me imaginar longe dela

Mesmo se odiasse a Kim, arrancaria cabelos pra dar certo com ela

Talvez pelo bem da Hailie, eu talvez tenha cometido alguns erros

Mas sou só humano, mas sou homem suficiente pra enfrentá-los hoje


O que eu fiz foi burrice, sem dúvida foi idiota

Mas a coisa mais inteligente que já fiz foi tirar as balas da pistola

Porque eu teria matado eles, merda, eu ia atirar na Kim e nos dois

É a minha vida, quero dar as boas-vindas ao show do Eminem


Desculpa, mãe, eu nunca quis te magoar

Eu nunca quis te fazer chorar

Mas hoje à noite, vou desabafar


Eu jamais desrespeitaria minha mãe só pra ganhar reconhecimento

Ouça de novo antes de achar que essa música falta com respeito

Mas tente se colocar no meu lugar, tente imaginar essa visão

Presencie a sua mãe mandando ver nos comprimidos na cozinha

Xingando, falando que alguém sempre mexe na sua bolsa e tem coisa faltando

Passando pelo sistema público de habitação, vítima da Síndrome de Munchausen

A vida toda me fizeram acreditar que estava doente quando não estava

Até que eu cresci, agora eu estourei, te deixo com dor de estômago, não deixo?

Não foi por isso que você fez o CD pra mim, mãe?

Pra tentar justificar a maneira como você me tratava, mãe?

Mas sabe, você está mais velha agora e fica frio quando está sozinha

Nathan está crescendo tão rápido que logo verá que tu é uma farsa

E a Hailie está crescendo tanto agora, você devia ver, tá linda

Mas você nunca vai vê-la, ela nem irá ao seu velório


Sabe, o que mais me magoa é que você não admite que errou

Dane-se essa música, continue falando que era uma mãe


Como você ousa tirar de mim o que você não me ajudou a ganhar

Vaca egoísta, espero que queime no inferno por toda essa merda

Lembra quando o Ronnie morreu e você que gostaria que fosse eu?


Bem, adivinha, eu estou morto, morto pra você!

Desculpa, mãe, eu nunca quis te magoar

Eu nunca quis te fazer chorar

Mas hoje à noite, vou desabafar"

Ele começa a música com uma agressiva desabafando sobre como ele foi moldado pelas experiências difíceis da infância, especialmente com sua mãe. Ele menciona sentimentos de raiva e rejeição, e de como essas experiências afetaram suas escolhas e o fizeram questionar o que é certo ou errado.

Verso 1:

Eminem fala sobre sua mãe, descrevendo como ela fez acusações contra ele e como isso afetou sua relação com ela. Ele expressa ressentimentos profundos por tudo que passou com ela e como se sentia como uma vítima da situação. Ele também menciona que nunca teve a chance de entender ou lidar com os traumas familiares. Isso gerou um rancor que se reflete em sua música.

Verso 2:

Aqui, ele faz referências às mentiras que foram espalhadas sobre ele e como ele foi incompreendido por muitas pessoas, incluindo sua própria família. Ele fala sobre o impacto de crescer em um ambiente difícil e como ele teve que se fazer forte para sobreviver a isso. Ele ainda expressa o desejo de lutar por sua própria identidade e de limpar a bagunça emocional que o cerca.

Refrão (novamente):

O refrão repete sua intenção de "limpar seu armário" (metaforicamente falando), o que significa limpar sua mente e resolver as questões internas.

Verso 3:

No último verso, Eminem fala sobre o quanto a dor e o sofrimento o fizeram quem ele é, mas ele também reflete sobre as consequências disso em sua vida. A raiva, a frustração e os sentimentos reprimidos começam a aparecer mais claramente. Ele também critica sua mãe por não aceitar a responsabilidade pelos problemas que ele enfrentou.

Ele fala de contatos, do passado, e de como sua história é marcada por esses traumas. "Antes de me jogarem no caixão e me fecharem lá, vou mostrar tudo. Vou te levar de volta a 1975, onde eu nasci, criança, antes de ter um disco de platina. Eu era bebê, tinha só uns dois meses. Em 1973, coelho na 5ª picha, ONO. Pai deve estar todo irritado com alguma coisa e se mandou, o pai dele foi embora quando ele tinha 6 meses. Me perguntou se um dia me deu um beijo de adeus." Ele segue falando sobre o quanto a relação com o pai foi difícil. "Olho pra rico e não consigo me imaginar longe dela, filha dele, talvez pelo bem da rede neutra. Talvez tenha cometido alguns erros, mas sou homem suficiente pra enfrentá-las, enfrentar as redes. O que eu fiz foi burrice, sem dúvida fui idiota, mas a coisa mais inteligente que fiz foi tirar as balas da pistola."

A música traz uma reflexão pesada sobre a dor que ele carregou. "Eu não sei se tinha intenções de incidir ou se seria tentar matar alguém. Não dá pra interpretar dessa forma. Eu teria matado." Ele fala da revolta contra as dificuldades. "Eu ia tirar a equipe nas ruas e agora explico... é a quem?" Ele segue falando sobre sua esposa e os pensamentos que teve de matar ou tentar suicídio. "Natália, minha vida, quero dar boas-vindas ao show do MN, desculpa, mas não questiono. Água nunca quis fazer você chorar, mas hoje vou desabafar mais uma vez."

Depois, ele diz novamente: "Eu jamais desrespeitaria minha mãe só pra ganhar reconhecimento. O que as pessoas estavam falando é que ele só fez essa música para ter sucesso, mas não foi isso. Ele desabafou." E ele continua, repetindo: "Antes de achar que essa música falta com respeito, tem que se colocar no meu lugar." Ele descreve a situação de sua mãe, dizendo que ela tinha uma doença, que tomava muitos remédios e xingava, acusando sempre alguém de mexer na bolsa dela, mas ninguém mexia. "Passava pelo sistema público de habitação, vítimas da síndrome de Münchausen." Ele descreve essa síndrome, que é uma doença psiquiátrica onde a pessoa finge ou induz sintomas de doença para obter cuidados médicos. Ele fala de uma situação semelhante que ele percebeu, em um documentário de uma mãe que fazia isso com sua filha.

Ele compartilha sobre como a mãe dele fez ele acreditar que tinha algo errado com ele, criando uma falsa narrativa. "A vida toda me fizeram acreditar que estava doente quando não tinha nada. Até que eu cresci e agora estou aqui." Ele menciona a dor que carrega, a raiva de tudo que viveu. "Deixe com dor no estômago, não deixo o que é dor no estômago. Raiva, inveja, pelo sucesso que ele conquistou."

Ele expressa em sua música, com toda a sua alma, a sensação de estar morto para sua mãe, dizendo: "Sinto muito, mãe, não quis magoar, não quis fazer você chorar. Mas hoje à noite, vou desabafar mais uma vez." E repete esse sentimento. "Essa música, eu cantava com toda a minha alma. 

Ele fala sobre outras mães e suas dinâmicas. "Algumas mães fazem isso, se passando por boas mães, mas, na verdade, elas tiram proveito da situação." Ele fala sobre uma música que o ajudou a entender melhor esses sentimentos, a se curar. "Eu sei que tudo vai ficar bem, as lágrimas vão secar. Eu sei que tudo vai ficar bem, as feridas vão cicatrizar, o que me impede de sorrir é o tempo que perdi, o que mais dói é o tempo que passei sem poder me defender."

Ele compartilha uma sensação de tempo perdido, de abuso, de dor. E finaliza, refletindo: "A vida inteira pela frente, mas o tempo que perdi, não posso voltar atrás. Agora, eu entendo, e vou aproveitar cada segundo como se fosse o último, porque já perdi muito."

Tudo que ele descreve, me é tão familiar. Parece que ele é da família lótus.

A flor de lótus tem uma capacidade única. Mesmo em condições extremas, ela mantém sua temperatura interna estável, e isso é biológico. Ela sobrevive à lama, ao frio, ao calor. Ela é indestrutível. Assim como nós, seres humanos, podemos ser indestrutíveis. Passamos por tantos desafios, dificuldades e traumas, mas ainda conseguimos manter nossa humanidade, nossa luz. E é isso que precisamos lembrar: somos seres extraordinários, capazes de superar tudo.

Não se sintam mal por serem diferentes. Não se sintam piores por não se encaixarem nos padrões da sociedade ou das famílias tradicionais. Nossa diferença nos torna especiais, como a flor de lótus, que é única, que precisa de um ambiente específico para florescer.

Entendam isso: o que buscamos muitas vezes é uma ideia de mãe, não a realidade. Somos um "órfão" desse amor idealizado, mas devemos seguir em frente

Eu oro para que todos vocês, que talvez estejam em situações difíceis, encontrem a força para seguir. Não importa a dor, vocês são indestrutíveis. Eu sou flor de lótus, você também é.  Acreditem em si mesmos, cultivem seu interior, e o futuro será brilhante.

Se você sentir raiva, não guarde isso para si. Coloque para fora, seja cantando, gritando ou qualquer outra forma que libere essa emoção. Guardar raiva só nos faz adoecer. Não precisa destruir nada, apenas expresse-se. E lembrem-se, a raiva tem que vir antes do perdão. Se você está com raiva, perdoar será mais difícil. Eu entendo, e muitas vezes não conseguimos perdoar, e tudo bem.

Vocês são seres indestrutíveis, flores de lótus, e acreditem que, se cultivarem essa força interior, terão um futuro brilhante.

Virginia Coser - Psicanalista Clínica - Registro SOPES - 0120-2021




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